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Araci faz gastança com praça “havaiana” e festão, assolado por El Niño
Farra de gastos na reconstrução de praça, recentemente reinaugurada, mas que precisará ser readaptada para ser funcional ao seu perfil de ponto central da cidade e poder oferecer proteção contra o sol, e em festão durante crise severa por falta de chuvas, com sinais de superfaturamento da obra e indícios de que sua contratação se deu mediante licitação dirigida.
Com não mais de 50 mil habitantes, segundo o censo do ano passado, o município de Araci, onde nasci em 1964, na atualidade é governado por Maria Betivania Lima da Silva, a “Keinha”, do PDT. Distante 210 km da capital baiana, meu rincão natal é marcado pela economia dependente da Prefeitura. Em plena incidência do El Niño, fenômeno que já fez perder a safra deste ano e provavelmente inviabilizará que a de 2024 venha a ser plantada, e poderá dizimar grande parte do rebanho bovino, caprino e ovino, a gestão da prefeita mostra-se alheia.
A administração que ela comanda gastou mais de R$ 4 milhões, a considerar o valor orçado inicialmente, mas que contaria com um aditivo de 25% ainda não publicado no Portal da Transparência do município, para reformular o principal logradouro da sede. Trata-se de praça que leva o nome da padroeira local, a Praça Nossa Senhora da Conceição, que foi reinaugurada no último domingo, 26 de novembro.
Em pouco mais de uma semana, para bancar uma só das três atrações da festa “Araci Folia”, a gestão da prefeita desembolsará acima de 10% do valor exato inicial orçado para essa obra. No dia 7 de dezembro, véspera do feriado religioso local, o cantor Bell Marques, destaque máximo do evento, receberá cachê de R$ 450 mil por sua apresentação.
O projeto de remodelação da Praça da Conceição foi implantado sem consulta pública. Ante a emergência da crise climática global, somada a fenômenos naturais periódicos como o do El Niño, que em extensa parte do país e na região já trouxe duas ondas de calor intenso antes da chegada do verão, a reformulação da praça, descontextualizada da história, geografia e paisagens locais, não cuidou de evitar legar um meio ambiente urbano superexposto à ação inclemente do sol.
Segundo vejo de longe, fisicamente, mas de perto, no coração, como um natural da terra descendente pelo lado paterno da família dos fundadores, o projeto é inegavelmente lindo para os olhos, fantástico, porém fantasioso. Na realidade, se traduzirá em um fiasco, caso não passe por readaptação.
A arborização dá primazia a palmeiras imponentes, meramente decorativas, que jamais proporcionarão sombra. A fileira de quiosques que foi disposta no agora ainda mais imenso jardim está em posição que degradará a vista ampla que antes havia do logradouro. Os quiosques estão dotados de cobertura adicional, feita de lonas, no estilo de velas de barco, que até poderão incrementar o calor quando não houver, o que é muitíssimo comum no lugar, correntes de vento. A estética, no geral, é de praia do Havaí em meio à aridez do sertão.
No Instagram da Prefeitura, cheguei a comentar, em alguns dos seus posts, que a praça bem que poderia passar a chamar-se Praça “Honolulu”. Honolulu é o nome da capital havaiana, localizada na ilha Ohau, a terceira maior e mais habitada do arquipélago do Havaí. Este, para os que desconhecem, não é um país próprio, e sim, oficialmente, um estado integrante dos Estados Unidos, situado em meio ao Oceano Pacífico.
Durante o São João, a gestão da prefeita já havia inaugurado um logradouro novo na sede. Construída do zero, a chamada “Praça do Tanque da Nação”, quase tão grande como a agora reinaugurada, teve orçamento ao redor de 28% do preço inicial desta remodelada.
Para enfrentar o que mais urge, a recorrente crise hídrica araciense, a administração de Keinha não promove a mesma gastança. Conversei sobre isso com Manoel Nunes, empresário local dos ramos de gráfica digital e de serviços de provedor de Internet, e terceiro candidato mais votado para prefeito na eleição passada, tendo concorrido através do Avante. Ele me disse que ela teria «licitado não mais de R$ 3 milhões para atender, por todo este ano, quem não dispõe de água encanada e precisa se valer da distribuição em caminhão-tanque na zona rural”.
Ocorre que em alguns pontos do vasto território municipal, com tamanho que supera 1 milhão e meio de quilômetros quadrados, a espera pela chegada de um caminhão com o precioso líquido – conforme Manoel Nunes relatou – «pode demorar 60 dias, ou até mais». Nesse contexto, ele ressaltou que a festa Araci Folia, “na proporção que está sendo programada, com mais outras duas atrações de peso, seria desnecessária”.
Conversei sobre aspectos financeiros e legais da execução da obra da Praça da Conceição com o primo materno, e colega, pois é advogado como eu, Carlos Alberto Moura Pinho. Ele é professor do curso de Direito da UEFS, em Feira de Santana, e foi vice-prefeito local durante a gestão de Daniel Ramos, de 1993 a 1996. Além dos sinais de superfaturamento, que eu vejo comparando o orçamente exorbitante previsto para refazê-la em relação ao orçado para a construir a Praça do Tanque da Nação, Moura Pinho agrega, com seu faro político e jurídico, que há no caso «claros indícios de licitação dirigida”.
Com capital social fincado em R$ 600 mil, a empreiteira contratada para a obra de reformulação faraônica da Praça da Conceição, HUMBERT SM CONSTRUÇOES EIRELI, é uma empresa local. O seu CNPJ, ao ser consultado na Receita Federal, no entanto aponta para outra denominação: H MOURA ENGENHARIA LOCAÇÕES E SERVIÇOS LTDA. Está instalada, conforme o endereço indicado em seus papéis, acima de modesta padaria na sede.
O seu sócio-gerente, Humbert Silva Moura, em junho de 2011 buscava trabalho no serviço público araciense. Na época, concorreu como candidato inscrito em concurso público a uma vaga de motorista de veículos leves na Secretaria de Educação municipal. Segundo publica em seu perfil no Facebook, ele estudou engenharia civil na Faculdade de Ciências e Tecnologia – FTC, em Feira de Santana, e atualmente tem cargo de engenheiro na Prefeitura de Araci.
Na rede social, aparece sem o último sobrenome, e omite, para não expor atuação totalmente a descoberto da lei, por ser funcionário público local, que é sócio-gerente de empreiteira participante de licitações no município. Como sócio cotista seria admissível a participação, porém não como dirigente ou administrador da empresa.
A pergunta que fica é quem são os que estarão por detrás dele e da empresa que empreitou a reconstrução da Praça da Conceição, manejando entre 4 e, caso comprovada a existência do aditivo contratual, mais de 5 milhões de reais?
Essa gastança é possível graças às receitas drenadas para Araci através do Fundo de Participação dos Municípios. Elas teriam de se destinar às prioridades locais e constituir trampolim para o desenvolvimento socioeconômico de minha terra natal. Os dispendiosos gastos com a praça principal e o Araci Folia dissipam riqueza produzida fora.
Logo, logo, a Praça da Conceição reinaugurada será sinônimo de mais gastos. Exigirá aportes de novos fundos públicos para adequar-se ao perfil que sempre teve. É o ponto urbano capital de um entorno onde se concentram serviços e comércios. Deve prestar-se a ser zona de abrigo do sol para a gente ali transeunte, principalmente a que aflui da zona rural municipal e de outras municipalidades durante os dias de feira livre, e que também não conta com sombra na nova Praça do Tanque do Nação.
Matéria reproduzida do:
https://searaaraci.wordpress.com/2023/11/29/araci-faz-gastanca-com-praca-havaiana-e-festao-assolado-por-el-nino/
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